Reaparecem sinais de preocupação com os números do Covid. São outra vez, os mais velhos que estão na linha da frente da tensão. Os novos focos de contaminação vêm de festas e eventos espontâneos promovidos de forma surpreendente, a juntarem pessoas em situações de convívio proibido. Uma juventude inquieta dá sinais de impaciência e arrisca a pele.
Algo aconteceu no nosso contacto geracional que tornou o diálogo com os mais jovens mais difícil e incompreendido. E o mal vem de longe…
Em criança lembro-me bem da estranheza que experimentava nos dias de festa lá em casa. Os aniversários eram animados. No final, os adultos afastavam as cadeiras da mesa e contavam histórias. Quando seguia pelo corredor ouvia-os a rirem-se como crianças! Era isso.
Os nossos pais educaram-nos num tempo austero e exigente. Conhecíamos deles a faceta mais dura e comprometida. Corriam de obrigação em dever, dando sempre sinais de estarem muito envolvidos no que faziam. Eram sérios e cerravam o rosto com significado quando algo corria mal. Trabalhavam muito e não davam tréguas ao cansaço e à necessidade de darem mais um pouco de esforço, se necessário.
Nos dias de festa ouvia a minha mãe a rir-se e a contar piadas. Estranha coisa! Parecia outra pessoa. Não estava tensa e ocupada, mas revelava desprendimento e irreverência. Não a reconhecia.
Esta impressão de compostura, vinda de um sénior, era para mim (para nós todos, afinal) mensagem poderosa. Um adulto não brinca. É sério, concentrado, não relaxa ou descontrai, tem sempre uma obrigação que o espera e um pedaço de energia extra para lhe dar resposta. Nunca colocavam o lazer e o descanso à frente das obrigações.
Pensando eles que com tal comportamento nos estavam a educar bem, para sermos responsáveis no futuro, afinal o que estavam a alcançar era bem diferente. Quando observava os meus pais, no seu dia-a-dia, pensava como seria duro um dia crescer e ter de ser assim como eles!
Os conselhos e ordens para estudar, chegar a horas, trabalhar mais, estar concentrado, ser responsável, soavam a tristeza. Não eram aliciantes e causaram mais dano do que naquele tempo nos apercebíamos.
Os nossos pais eram um pouco como aquele chefe ou diretor responsável que todos os dias à frente da equipa, se queixa da vida que leva, do pouco que ganha, do muito tempo que trabalha, esperando com isso, estar a motivar os colaboradores.
No meu tempo de menino isto assustava. Olhava em perspetiva para o futuro e não ficava animado com o que via. Cada geração passa à seguinte mensagem própria dos seus valores de época. A nossa está agora a lidar com outros desafios: ajudar os mais novos a cumprirem regras sem lhes fazer perder o encanto de crescerem com boas referências.
Dadas as circunstâncias, não temos forma de falhar nestes objetivos. Por um lado, precisamos de os treinar a serem melhores homens e mulheres. Por outro, não podemos esquecer a herança que trazemos, sem impormos regras do passado imutáveis.
Precisamos de construir uma liderança mais reconhecida do que imposta!
Jorge Henriques